Imagem retirada de: Len Sassaman pode ter sido o criador do Bitcoin - Livecoins
Introdução
Li uma postagem sobre Len Sassaman no começo do ano e percebi que apesar de não ser tão conhecido como um dos prováveis candidatos a Satoshi Nakamoto da vida real ele teve algum papel na história da criação do Bitcoin. O teve (no passado) é uma licença poética, na realidade ele se suicidou no dia 03/07/2011 quando tinha 31 anos. A última mensagem de Satoshi Nakamoto é de 26/04/2011 que entre outras coisas teria dito que “estaria seguindo em frente atrás de outros projetos”. São 68 dias separando a data do “sumiço” de Satoshi Nakamoto e a data do suicídio de Len Sassaman. Pode e deve ter sido apenas uma mera coincidência, mas que tem lá alguma coisa meio “sinistra” me parece que tem. E a história fica mais interessante visto sob esta ótica meio misteriosa.
Se por um lado ele foi brilhante e idealista também conviveu com depressão e distúrbios neurológicos funcionais. Autodidata logo se interessou por assuntos relacionados a criptografia e aos 18 anos fez parte da IETF - Força-Tarefa de Engenharia da Internet responsável pelo protocolo TCP/IP. No ano de 1999 passou a frequentar a comunidade cypherpunk na região de San Francisco Bay Area (estado da Califórnia e perto do Vale do Silício, é sempre importante ressaltar o local) e foi morar com Bram Cohen (o cara que criou o BitTorrent, um serviço online de compartilhamento de arquivos, principalmente grandes e que funciona na rede P2P).
Se existem muitas dúvidas sobre quem foi realmente o criador do Bitcoin, ou quais foram, parece inegável a ligação entre a sua origem e a comunidade cypherpunk que girava em torno da Baia de São Francisco, no estado americano da Califórnia.
Cyberpunks x Cypherpunks
Antes de partir para os finalmente precisamos esclarecer resumidamente e para os que eventualmente ainda não saibam que existem diferenças entre CYBER punks e CYPHER punks.
Cyber é o diminutivo da palavra cybernetic (cibernético) que podemos resumir como coisa ou lugar onde existe bastante tecnologia de ponta, principalmente envolvendo computação e tudo que é ligado a esse segmento (internet, automação etc.). Punk é um movimento de contestação cultural e social exteriorizado através da música, das roupas, penteados e do comportamento. A junção das palavras cyber + punk aconteceu no começo dos anos 80 como um subgênero do universo da ficção científica, ou seja, apareceu pelas mãos de escritores. Longe de querer esgotar a discussão em torno dos cyberpunks nosso foco é mostrar a origem literária do termo, ou seja, cyberpunks nasceram como personagens literários de histórias de ficção científica fazendo parte do universo de livros, games e filmes de ficção científica. Atribui-se ao escritor Bruce Bethke a criação do termo cyberpunk, que foi usado no título de um conto escrito em 1980 e publicado em 1983 na revista Amazing Science Fiction Stories. Ainda no terreno da literatura um dos escritores mais conhecidos desse universo é William Gibson a quem se atribui, por exemplo, a criação do termo ciberespaço. Neuromancer, publicado em 1984 foi seu primeiro livro e tornou-se uma das inspirações de um filme muito cultuado pela comunidade, colaborando inclusive com o nome do filme: Matrix.
Cypher infelizmente não tem nada a ver com um certo estilo de dança hip-hop neste texto. O personagem “traíra” interpretado por Joe Pantoliano no primeiro filme Matrix não me parece fiel ao tipo de gente que vive no universo cypherpunk. Na língua portuguesa, entre outros significados temos a palavra cifra (substantivo) e no caso do verbo temos a palavra cifrar. Mas também existem outros significados como por exemplo a representação de números (quantas cifras tem seu saldo bancário?). Atribui-se a uma hacker conhecida como Jude Milhon (conhecida como St. Jude), que morava na região da Baia de São Francisco (Califórnia, perto do Vale do Silício) a criação da palavra cypherpunks, sendo uma das fundadoras desse grupo informal. Jude faleceu em 2003, mas deixou alguns livros e um deles, publicado em 1995, que eu não li, curiosamente tem a palavra cyberpunk (não é cypherpunk) no título (Cyberpunk Handbook: The Real Cyberpunk Fakebook: How to be na Online Dude or Fake it Really Well). Em tradução livre: Manual do Cyberpunk: O verdadeiro livro de cabeceira dos cyberpunks, como fingir muito bem online que você é um cyberpunk da vida real.
Não posso garantir que cyberpunks existem apenas nos livros, games e filmes, mas sua origem indiscutivelmente saiu desse universo fictício. Todavia nada impede que pessoas se considerem cyberpunks e até que formem comunidades, acho que existem grupos e pessoas assim, mas não fui tão a fundo nesta questão. Já no caso dos cypherpunks sua origem é real, com personagens de carne e osso circulando por um lugar específico, a Baia de São Francisco na Califórnia, perto do Vale do Silício. Um desses personagens da vida real é Len “Rabbi” Harris Sassaman.
Len Sassaman x Personagens Conhecidos
Quem realmente projetou/concebeu e escreveu os códigos, executou o primeiro nó e minerou o primeiro bloco (gênese) do Bitcoin? Essa é a pergunta de um milhão de bitcoins. Já se sabe a identidade de algumas pessoas do “entorno” que participaram contribuindo de alguma forma para que a coisa tivesse continuidade. É provável que alguns permaneçam de certa forma relegados ao segundo plano nesta história enquanto outros aparecem com mais visibilidade. Muitas especulações e nenhuma certeza cercam a identidade real do codinome Satoshi Nakamoto. Por que criar um nick com nome e sobrenome? Por que usou nome e sobrenome japonês? Se olharmos a lista de endereços dessa turma achamos nomes de usuários cadastrados com o primeiro nome, com a inicial do primeiro nome + sobrenome, com sobrenome, com números ou não etc. (ao invés do nome e do sobrenome o nick poderia ser satoshi123@crypto, sn321@crypto, naka213@crypto, snaka132@crypto, snbit111@crypto etc. Será que o criador do Bitcoin já prevendo o tamanho da sua obra e imaginando que não ficaria bem atribuir uma criação desse tamanho a um nick simples como someone99@crypto decidiu usar nome e sobrenome?
Len Sassaman era obcecado por privacidade com foco especial nos sistemas de comunicação anônimos. Por causa disso era um especialista em criptografia e teoria da informação. Durante sua breve jornada neste mundo Len trabalhou com Hal Finney que entre outras coisas é o criador do sistema que serviu de base para o PoW – Proof of Work usado no processo de mineração do Bitcoin. Hal Finney é um dos personagens reais/conhecidos que mais interagiram e contribuíram com Satoshi Nakamoto. Algumas teorias afirmam que Hal Finney seria Satoshi Nakamoto. Neste caso seria um caso de dupla personalidade considerando que existem várias interações entre o usuário imaginário Satoshi Nakamoto e Hal Finney?
Len Sassaman foi o principal desenvolvedor, operador de um nó e principal mantenedor de um serviço chamado Mixmaster (remailer ou repostagem) bastante usado pelos cypherpunks para preservar suas identidades. Esse serviço funcionava numa rede P2P usando nós descentralizados que distribuíam blocos de tamanho fixo de informações criptografadas. Este conceito é considerado um dos pilares do Bitcoin, que é a possibilidade de trocar dados de forma privada sem depender de um serviço centralizado e ocultando a identidade verdadeira dos usuários. Se substituirmos mensagens de e-mail trocadas de forma anônima por ordens de transferência de saldos temos um dos princípios do sistema Bitcoin. Nasceu aí a percepção entre os usuários e mantenedores deste sistema a necessidade de terem algum tipo de monetização, afinal de contas o altruísmo não ajuda na compra de equipamentos e no pagamento dos boletos no fim de cada mês.
Outro personagem que cruzou com Len Sassaman e que também interagiu com Satoshi Nakamoto é Adam Back, da Blockstream. Adam Back criou um sistema de prova de trabalho batizada de HashCash para operadores de repostagem combaterem spans e ataques DDOS. Esse sistema foi mais uma peça que entrou na construção do Bitcoin (item 06 dentre as 08 referências bibliográficas citadas no whitepaper do Bitcoin). Len e Back trabalharam juntos em implementações de OpenPGP (sistema usado para criptografar mensagens e arquivos que gera chaves que permitem a autenticação/validação nas duas pontas).
Outro personagem real que entrou na vida de Len Sassaman é David Chaum, criador do Digicash, que faliu e considerado o “pai da moeda digital” a partir de um artigo escrito em 1983 chamado de “Blind Signatures for Untraceable Payments”. Len trabalho na COSIC – Computer Security and Industrial Cryptograph na Bélgica, onde Chaum era consultor. Atribui-se também a Chaum a criação do Blockchain, posteriormente aproveitado quase totalmente para a criação do Blockchain do Bitcoin. Pelo fato de ter sido incluído no bloco gênesis a manchete de um dos principais jornais londrinos da época existe a suspeita de que Satoshi estaria morando na Europa naquele momento e Len estava morando na Bélgica.
Entre outros estudo Len dedicou-se a busca de solução para o problema da Falha Bizantina ou Problema dos Generais Bizantinos que era um dos grandes obstáculos para o funcionamento de uma rede P2P (computação distribuída). Outra questão que está entre os fundamentos sobre os quais o Bitcoin foi construído foi a solução deste problema.
Outro personagem, mais desconhecido ou pouco citado que cruzou a breve vida de Len Sassaman foi Dan Kaminsky, que também faleceu jovem aos 42 anos. Len e Kaminky foram coatores de um artigo intitulado PKI Layer Cake: New Collision Attacks against the Global X.509 Infrastructure. Kaminky foi um pesquisador de segurança da computação e consta que revisou a codificação do Bitcoin e afirmado com surpresa que Satoshi havia previsto e se precavido contra diversos tipos possíveis de ataque.
Outro personagem da vida real com quem Len trabalhou foi Roger Dindledine, fundador do navegador TOR, que esconde a sua localização impedindo que os sites visitados saibam onde você está. Também é essencial para se aventurar na “deep web”, caso queira se arriscar por lá.
No início da sua vida, quando morou na região da Baia de São Francisco Len morou e colaborou com Bram Cohen, criador do BitTorrent, compartilhador de arquivos que funciona na rede P2P. Bram Cohen também desenvolveu a MojoNation baseado em tokens chamados de Mojo que é considerado como sendo uma das primeiras moedas digitais realmente funcionais baseada em operações registradas num formato de livro razão público e operando através de nós distribuídos numa rede P2P. Esses tokens podiam ser convertidos ou trocados por dólares. Faltou ao MojoNation se precaver contra a hiperinflação que levou este projeto ao colapso e talvez tenha ajudado Satoshi a criar uma moeda deflacionária. Um dos cofundadores da MojoNation, Zooko Wilcox é o fundador da Zcash, criptomoeda com foco na privacidade.
Conclusão
Uma das questões centrais sobre os projetos anteriores ao surgimento do Bitcoin é que praticamente todos eles adotaram uma abordagem essencialmente capitalista (não que eu seja contra) patenteando e registrando suas criações. Quem tentou ficar rico protegendo sua criação não expôs/abriu o projeto para análises, críticas e sugestões com o espírito realmente humilde para ouvir, debater e incorporar ideias dos outros, que podem ser melhores do que as suas. Não duvido que tenham discutido e debatido dentro de um círculo mais próximo de colaboradores, mas ainda muito longe do que foi feito com o Bitcoin.
O projeto que deu certo e se consolidou como uma ideia realmente inovadora foi criado em código aberto e suas entranhas foram totalmente expostas de forma gratuita, ficou disponível para receber críticas, sugestões e melhorias o tempo todo, por qualquer um que tenha capacidade para isso. Quem já viu alguém desenvolver um projeto sabe como é o sentimento de posse e o ciúmes que um projeto gera no seu criador.
Existe uma visão idealista tanto sob o aspecto da liberdade econômica como da privacidade num mundo repleto de vigilância e controle.
Não bastava ficar anônimo num mundo altamente cibernético, era preciso ter uma forma de dinheiro não rastreável.
Principais Fontes:
Cypherpunks x Cyberpunks: Os Cyberpunks, os Cypherpunks e Blockchain - A criação
Curriculo do Len “Rabbi” Sassaman: https://web.archive.org/web/20111002192432/https://securehomes.esat.kuleuven.be/~lsassama/
IETF: Força-tarefa de engenharia da internet (ietf) – Definirtec
San Francisco Bay Area: https://wikitravel.org/en/Bay_Area_(California)
BitTorrent: BitTorrent: o que é e como funciona?
Rede P2P: O que é P2P e como ela funciona?
Hal Finney: Os muitos fatos que apontam para Hal Finney ser Satoshi | Cointimes
Repostador de e-mail: https://www.netinbag.com/pt/internet/what-is-an-anonymous-remailer.html
MixMailer: Mix networks — MixMailer docs 0.1 documentation
OpenPGP: https://pt.wikipedia.org/wiki/OpenPGP
Problema dos Generais Bizantinos: https://www.youtube.com/watch?v=wvtoZgS6kKY
Len e Kaminky: https://www.researchgate.net/publication/220797094_PKI_Layer_Cake_New_Collision_Attacks_against_the_Global_X509_Infrastructure
Bram Cohen, P2P, BitTorrent e MojoNation: https://trickdroid.org/bram-cohen-criador-do-protocolo-bittorrent-e-p2p/
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