A Invenção que já vale quase 2 trilhões de dólares
De acordo com dados do site Coinmarketcap na data de hoje, dia 19/02/2024, a capitalização de mercado dos criptoativos ronda a casa dos 2 trilhões de dólares, ou seja, já vale cerca de 10 trilhões de Reais. Esse valor representa a soma de mais de 2.2 milhões de criptoativos monitorados pelo site. O principal criptoativo continua sendo o Bitcoin que isoladamente detém mais de 52% e vale mais de 1 trilhão de dólares. Os cinco principais criptoativos juntos representam algo em torno de 80% do valor de mercado dos criptoativos.
Imagem criada a partir de prints parciais retirados em 15/02/2024 do site: Preços, Gráficos e Capitalização de Mercado das Criptomoedas | CoinMarketCap
A notícia fantasiosa
Print parcial retirado em 19/02/2024 de: https://www.wsj.com/world/middle-east/militants-behind-israel-attack-raised-millions-in-crypto-b9134b7a
No dia 10 de outubro de 2023, foi publicado um artigo assinado por Angus Berwick e Ian Talley no site do jornal The Wall Street Journal com o seguinte título, no original: “Hamas Militants Behind Israel Attack Raised Millions in Crypto”, em tradução livre: “Militantes do Hamas responsáveis pelo ataque a Israel arrecadaram milhões em criptomoedas”. Não é preciso ler o resto da matéria para deduzir o que vem depois do título. E aparentemente a notícia pode ter atendido um dos possíveis objetivos que era o de pressionar os políticos americanos por maior regulamentação do setor. Após a publicação da notícia senadores e deputados americanos começaram a defender maior regulamentação para o setor citando a notícia do prestigiado jornal americano especializado em finanças.
A Repercussão no Congresso Americano
Sete dias depois, numa carta datada de 17/10/2023, endereçada para Brian Nelson, Subsecretário para Assuntos de Terrorismo e Inteligência Financeira do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos e para Jake Sullivan, Assessor para Assuntos de Segurança Nacional da Casa Branca que foi assinado por cerca de 100 membros do Congresso entre Senadores e Deputados os congressistas expressam preocupação e cobram explicações das autoridades.
Print parcial retirado em 19/02/2024 de: https://www.warren.senate.gov/imo/media/doc/2023.10.17%20Letter%20to%20Treasury%20and%20White%20House%20re%20Hamas%20crypto%20security.pdf
Tradução livre do trecho acima:
“Prezados Subsecretário Nelson e Sr. Sullivan:
Escrevemos para expressar a nossa grave preocupação relativamente aos relatos de que, nos meses que antecederam o seu brutal e horrível ataque de 7 de Outubro a Israel, o Hamas e a Jihad Islâmica Palestiniana (PIJ) arrecadaram milhões de dólares em criptomoedas – escapando das sanções dos EUA e financiando as suas operações. Na verdade, entre agosto de 2021 e junho passado, os dois grupos arrecadaram mais de US$ 130 milhões em criptomoedas e movimentaram milhões entre si, ‘com PIJ enviando mais de US$ 12 milhões em criptomoedas para o Hezbollah desde 2023. Como relata o Wall Street Journal, ‘pesquisadores que estudam o financiamento do Hamas disseram que as criptomoedas continuam sendo uma das várias ferramentas que o grupo usa para arrecadar fundos’. Dado o perigo claro e presente representado pelo financiamento destas e de outras organizações militantes, pedimos à Administração que forneça detalhes adicionais em seu plano para impedir o uso de criptomoedas para o financiamento do terrorismo”.
O que dizem os especialistas (verdadeiros)
Print parcial retirado em 19/02/2024 de: https://www.chainalysis.com/blog/cryptocurrency-terrorism-financing-accuracy-check/
Em tradução livre, num dos parágrafos iniciais do texto publicado com o título acima no blog da Chainalysis temos o seguinte: “Embora o financiamento do terrorismo seja uma parcela muito pequena da parcela já muito pequena do volume de transações de criptomoedas que é ilícita, algumas organizações terroristas levantam, armazenam e transferem fundos usando criptomoedas. As organizações terroristas têm utilizado historicamente e provavelmente continuarão a utilizar métodos tradicionais baseados em fiduciários, como instituições financeiras, hawalas e empresas de fachada, como seus principais veículos de financiamento”.
Quem tem noção do funcionamento de uma criptomoeda, principalmente das maiores que já se consolidaram no mercado, sabe que a movimentação de uma criptomoeda é muito mais rastreável do que as formas tradicionais e que já são utilizadas há muito mais tempo para fins ilícitos, precedendo o surgimento das criptomoedas, por causa da rastreabilidade oferecida pelos Blockchains. Um bom serviço de análise pode identificar e ajudar a interromper o fluxo de criptomoedas utilizadas para fins ilícitos.
O desmentido oficial
Print parcial retirado em 19/02/2024 de: https://www.coindesk.com/policy/2024/02/14/us-treasury-backs-down-narrative-that-hamas-relied-on-crypto-to-fund-terrorism/
Tradução livre do print acima, parênteses nosso:
“Tesouro (Departamento, equivale a Secretaria do Tesouro no Brasil) dos EUA desmascara narrativa de que o Hamas dependia da criptomoedas para financiar o terrorismo
O principal funcionário do Tesouro (dos Estados Unidos) sobre terrorismo, Brian Nelson, disse que o Hamas e outros grupos ainda preferem o financiamento tradicional e que as criptomoedas não tem um grande impacto em seu financiamento”.
No dia 14/02/2024, Brian Nelson compareceu ao Comitê de Serviços Financeiros da Câmara Federal dos Estados Unidos. Em seu depoimento Brian Nelson endossou o que já tinha sido esclarecido anteriormente por empresas especializadas em análise de Blockchains como a Chainalysis e Elliptic que se manifestaram tendo em vista a informação errada publicada pelo jornal The Wall Street Journal. O Subsecretário foi além e disse que o grupo terrorista Hamas usa fontes tradicionais para angariação de grande parte dos recursos e o uso de criptomoedas tem pouco impacto. Apesar do próprio jornal ter revisado a notícia errada já existem Senadores e Deputados Americanos defendendo a criação de novas leis para regulação do mercado de criptoativos citando o artigo inicial do The Wall Street Journal que reportou erroneamente que o Hamas teria arrecadado milhões de dólares usando criptoativos, conforme mostramos acima, no subtítulo “A repercussão no Congresso Americano”.
O ciclo de ação
Repórteres e influenciadores atuando em veículos ou canais relevantes são “acionados pelas fontes” para repercutirem determinado assunto ou tema. São alimentados com dados e até com depoimentos. Depois que o tema é apresentado lobistas procuram políticos ou geralmente seus assessores para “sugerir” que prestem atenção a determinado assunto ou tema que está repercutindo na mídia. Quando o tema é quente como foi o caso da invasão do território Israelense por parte do grupo Hamas existem grandes chances de ganhar atenção dos políticos. O próximo passo é chamar o Secretário (ou o principal executivo se o assunto envolve uma empresa privada, um dos últimos chamados foi o Zuckenberg da Meta) responsável pelo assunto no governo. Em seguida os Congressistas elaboram uma proposta de criação de lei (geralmente com cláusulas “sugeridas” pelos lobistas interessados).
Conclusão
Não somos ingênuos a ponto de acreditar que as criptomoedas/criptoativos não são usadas para fins ilícitos. Elas são usadas mas a escala ainda é bem pequena em relação a outras formas tais como dinheiro vivo, joias, quadros, doleiros, empresas de fachada, contas bancárias em nome de laranjas etc. No entanto, conforme registramos no início, o valor de mercado das criptomoedas já está batendo na casa dos 2 trilhões de dólares. O mercado institucional já considera criptomoedas como Bitcoin e Ethereum como opções para diversificação de portfólios. Isso chama a atenção dos interessados. Como parte disso temos movimentos como o que registramos acima que é um exemplo de um processo que acontece o tempo todo e com os mais variados assuntos, em todos os cantos do mundo. Não tem nada a ver com teorias da conspiração de gente meio doida. É a vida real como ela é.
Se o Bitcoin fosse ilegal como são as drogas ilícitas, a justiça americana não venderia os Bitcoins que eventualmente são apreendidos em leilões públicos e não haveria ETF - Exchange Traded Fund sendo negociadas nas principais bolsas americanas.
Links citados:
Tratamos sobre financiamento ao terrorismo em outro postagem por aqui: