Introdução
O ano já começou (é sério, pode acreditar) e vamos retomar nossa tarefa de incomodar os 3 leitores mais teimosos deste site. E como toda máquina (ou gente) velha e enferrujada essa coisa só pega na base do “tranco” e vamos começar falando … de nada importante…, ou melhor, de uma daquelas bobagens que gente velha e desocupada como eu se dá ao direito, cada vez mais.
O processo de migração populacional do campo para a cidade foi e ainda é um dos motores que alavancaram o desenvolvimento tecnológico da humanidade. Boa parte das invenções foram e estão sendo criadas para facilitar a nossa vida que é vivida na maior parte do tempo nas cidades, tipo tudo junto e misturado. Sem falar dos serviços que estão disponíveis a poucos passos. Eu mesmo sou um bom exemplo disso, sou um bicho do mato no sentido mais literal da coisa, nasci e cresci num sítio no interior do estado. Vim para a capital para estudar e trabalhar. Aqui cheguei e aqui fiquei, até agora. Hoje muitas pessoas alçam voos mais distantes, estudam e trabalham em outros países. Possivelmente, se depender do tio Elon Musk, pessoas partirão rumo a outros planetas, luas etc. para explorar, estudar, trabalhar e morar.
É claro que todos essas máquinas e/ou equipamentos que facilitam o nosso dia a dia também são objeto de desejo de quem mora no campo. Excluindo as coisas que são projetadas e construídas exclusivamente para quem vive no campo boa parte de tudo que se cria e se produz é pensado para quem vive nas áreas urbanas, entre outros motivos porque é onde tem mais gente e, portanto, onde possivelmente haverá mais compradores interessados. Os dados de 2015 da PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE registram que cerca de 85% da população brasileira mora em centros urbanos [1]. Na região sudeste esse percentual chega a 93% deixando apenas 7% da população ocupando o campo. Mesmo nas regiões norte e sudeste o percentual gira em torno dos 70%. De 2015 para o panorama não deve ter se alterado de forma significativa. Vale registrar que esse panorama pode sofrer alguma influência da COVID-19 mas esse tipo de influência será apurado mais adiante. Por hora o cenário é esse.
imagem retirada do site: IBGE - Educa | População rural e urbana
Em termos mundiais essa migração do campo para a cidade acontece de forma mais lenta. Até 2008 havia mais gente no campo do que nas cidades. A partir deste ano a população urbana ultrapassou a população no campo. De acordo com dados da ONU a população urbana contabilizou cerca de 4.4 bilhões de pessoas, isso equivale a 56,2% da população global [2]. Nessa conta entram países como Bélgica e Japão que tem mais de 90% da população vivendo em áreas urbanas e países da África onde a população rural gira em torno de 58% segundo dados de 2019 [3].
Imagem retirada de: O mundo mais urbanizado e as cidades virando saunas
Como o nosso objetivo é divagar (não é gente nem carro lento na sua frente) sobre o limite da automação em nossas vidas vamos parar de falar sobre migração, população etc. Urbanização, ecologia, migração etc. são assuntos quentes que não fazem parte do foco deste site. Vamos ao que nos interessa ou não, vai saber.
Viajando
Antes de embarcar nesta “viagem” assista o vídeo abaixo:
Estamos comprando, instalando e usando diversos produtos e/ou aparelhos que tornam nossas vidas e casas mais agradáveis, amistosas, seguras, funcionais e práticas. Tudo para facilitar nossa vida (moderna) que não está fácil, não é mesmo? Os exemplos estão aí sendo usados diariamente: aspirador de pó que trabalha sozinho, desvia de obstáculos e não cai na escada sendo que alguns até “passam pano” literalmente diga-se de passagem; máquinas que lavam louça; portão da garagem; máquinas que lavam e secam roupa; lâmpadas que funcionam por comando de voz ( …pelo menos atende por Alexa em vez de Maria, Ricardão etc…); ar condicionado que liga numa determinada hora ou sempre que a temperatura ambiente ultrapassa o nível pré-definido; fechadura da porta controlada por digitais, códigos e outras coisitas; janelas que abrem e fecham por algum tipo de comando, temperatura, horário etc.; máquinas que fazem café numa determinada hora pré-agendada; aparelhos que obedecem comando de voz para ligar o som, mostrar uma receita no YouTube, trocar para música ou até atender uma ligação que chega na hora errada; câmeras filmando e aparelhos ou escutas (talvez clandestinas?) ouvindo nossas ordens e por aí vai. E nem estamos falando dos celulares e das pulseiras que estão na moda e que controlam suas horas de sono, seus batimentos cardíacos e outras coisas. Alguns já existem há algum tempo e outros estão surgindo todo dia, inclusive para facilitar a nossa vida e a vida até de quem não é gente como a gente (cachorros, gatos etc.).
Por enquanto ainda não temos um “sistemão foda” controlando tudo isso (certamente alguns já construíram suas próprias soluções pessoais agrupando tudo num controle único num tablet) mas no geral essas geringonças cada vez mais entuxadas de placas e códigos funcionam basicamente de forma independente (a não ser que sejam do mesmo fabricante), cada um com seu sistema próprio (embarcado), fazendo sua tarefa no seu mundinho para o qual foi programado, cumprindo nossas ordens quando queremos, precisamos e resolvemos usá-los de acordo apenas e tão somente com base na nossa vontade e/ou necessidade, que no fundo é o que importa. Bom, na prática sabemos que não é exatamente assim, de vez em quando esses troços funcionam contra a nossa vontade e/ou nas horas mais indevidas.
E o que é um PC senão um monte de sistemas ou equipamentos com cada um fazendo alguma coisa para o qual foi programado (navegador, processador de texto, tocador de música, editor de vídeo, mouse, teclado, disco rígido ou SSD, processador, caixa de som etc.? Pois é, só que neste caso alguém agrupou tudo isso sob um controle único e deu o nome de sistema operacional. Nem vamos discutir a importância de um sistema operacional que é imprescindível para nós, pobres mortais. Todo o resto passou a depender da boa vontade desse tal sistema operacional que basicamente controla tudo a partir do momento em que o PC é ligado até ele ser desligado. Ele é tão bom que mesmo desligado ele continua trabalhando (pelo menos enquanto a bateria estiver boa, guardando informações como data e hora). Ou seja, a diferença entre o que acontece num PC e uma casa, por enquanto é que os produtos “caseiros” funcionam na hora e quando queremos que eles funcionem, seja por agendamento ou por comando dado na hora em que decidimos usá-los. …alexaaa… Já no caso dos PC’s, por enquanto, a coisa é um pouco diferente. Esse tal sistema Windows, por exemplo, insiste em fazer ou melhor resolve procurar atualização exatamente quando estamos fazendo algo interessante e começa a consumir recursos do PC sem dó e sem se preocupar com o que você está fazendo. Claro que dá para ajustar quando ele vai fazer isso, mas no estado puro ele procura quase toda hora. Já entendeu quando e porque eu resolvi divagar? Não confunda com devagar. Talvez o Windows esteja dando uma indireta para você parar o que está fazendo para que ele possa fazer o que ele decidiu fazer naquele momento. Outros tantos programas são instalados por esse tal sistema operacional sem ao menos perguntar se queremos ou não e depois você que se vire. Aliás de uns tempos para cá, se você pesquisar no Google por algo do tipo…o que é isso ou aquilo que está consumindo 100% do disco…vai ter uma ideia do estado da arte em que chegamos em questão de consumo de recursos. Se você usa o PC para acessar sua conta bancária (dos bancos grandes como CEF, Bradesco etc.) num PC ao invés de usar o smartphone vai ter que instalar um bendito de um “troço ou tecnicamente – componente de segurança” que vai monitorar sua navegação pela internet sempre que você acionar seu navegador para garantir a sua segurança. Mas é para a sua segurança, portanto se aquiete aí.
Pensa aqui comigo, será que não estão projetando por aí um sistema operacional que vai controlar tudo que funciona numa casa? Que tal comprar uma casa podendo escolher entre uma casa com sistema operacional modelo/tipo Windows, IOS ou com alguma variante do Linux? Ou algum outro sistema operacional que ainda vai ser desenvolvido?
Se por acaso você escolher o modelo/tipo Windows (se e quando sair algo desse tipo garanto que vai ter gente comprando) correrá o risco de comprar uma casa com 5 ou 6 cômodos e levar uma casa com 2 ou 3 cômodos funcionando bem no máximo, porque os demais estarão ocupados por um monte de coisas que o modelo/tipo Windows decidiu colocar lá dentro mesmo que você não queira e nunca vá usá-los. Talvez alguns se instalem sem que ao menos você saiba sequer que eles existem ou para que servem. Talvez esse modelo/tipo de sistema operacional tenha sido programado para funcionar de maneira ideal numa casa com 20 cômodos, mas ela é vendida e instalada sem possibilidade de ajustes (para usuário comum) numa casa com 5, 10 ou 15 cômodos ocupando todos os espaços que ela precisa para funcionar (mesmo que você não saiba nem para que servem), no fundo eu desconfio que o sistema operacional não vai se importar com quem vai morar nela. E nada de querer tirar isso ou aquilo porque isso pode colocar sua casa em risco. Uma coisa vai estar ligada em outra e se você excluir uma coisa pode ser que outra pare de funcionar. Os construtores e os vendedores destas casas com sistema operacional deste modelo/tipo decidirão entre eles que você não saberá escolher ou decidir o que você vai querer instalado e funcionando na casa que você vai comprar e pagar achando que é sua com seu dindin ganho com seu suor. Resumindo, você vai ter que ficar com a casa do jeito que eles querem e não do jeito que você eventualmente queira. Todo e qualquer espaço disponível pode e será usado pelo sistema sem que você faça ou tome alguma decisão, tudo em prol da sua segurança. O sistema operacional da sua casa vai decidir que a sua casa deve ter janela antirruído por que tem muitos pássaros cantando por perto, que você não precisa de garagem porque pode deixar o carro na rua, vai escolher a cor externa e dos cômodos mesmo que você não goste desta ou daquela cor etc.
Sofrendo com a tecnologia
Que tal chegar em casa depois de um dia de trabalho cansativo, debaixo de sol ou na rua e louco para tomar um banho bem refrescante e/ou relaxante. Ao chegar em casa você se lembra que a fechadura funciona por leitura digital, o quarteirão está sem energia porque algum infeliz bateu no poste da rua à tarde, a companhia de energia ainda não restaurou a energia e a bateria da fechadura acabou (se é que ele tem isso) e você precisa digitar a senha … e dá aquele branco, daqueles que nos atingem nas horas impróprias. A patroa #partiupracasadamãeousogra levando o(s) filho(s) e o totózim de quatro patitas depois que a energia acabou à tarde e não atende o celular nem o telefone … humm … Com muito custo você tem um daqueles repentes em momentos de desespero e lembra qual é a senha e consegue entrar em casa querendo tomar aquele banho. Chegando lá descobre que nada funciona no banheiro porque torneira, descarga, chuveiro, luz etc. funcionam apenas e tão somente se o sistema operacional estiver funcionando. “Bate” aquela fome sempre que você chega em casa tarde da noite sem ter dado nenhuma beliscada depois do almoço e você resolve ir pra cozinha. Como não tem energia no bairro nada funciona (melhor nem tentar abrir a geladeira né, fogão não vai acender e você não fuma por isso não tem como acender porque esqueceu de comprar fósforo pra usar sabe lá de vez em quando, torradeira, liquidificador etc. nada que depende de energia pode te ajudar e a Alexa então, não está nem aí fazendo sabe-se lá o que, talvez dormindo… Talvez nem tenha água porque a bomba não consegue jogar água pra caixa lá em cima. Nem pense em improvisar porque não se deve fazer esse tipo de coisa que além de não resolver o problema pode criar outro(s) pior(res). Talvez seja o caso de pedir um delivery já se preparando pra descer e subir váááááários degraus de escada (talvez no escuro usando a lanterna do smarphone se ainda tiver bateria) se você mora num prédio e por azar num andar alto, pense nisso na hora de comprar um apartamento, se ainda não comprou.
De repente, não mais do que de repente, a bendita energia é reestabelecida e alguns vizinhos comemoram dando gritos, parece até que algum time ganhou algum jogo importante. Lembrando que a nossa casa tem um sistema operacional, quando os equipamentos vão sendo religados o diligente sistema operacional se encarrega de checar cada um dos aplicativos para reestabelecer, corrigir eventuais problemas, reinstalar algum programa corrompido, verificar vírus e bugs, fazer atualizações (vai que alguma atualização importante ou imprescindível para garantir a segurança foi disponibilizada durante a falta de energia, para resolver um bug ou falha que alguém esquecer de testar direito antes de liberá-lo) etc. Depois de alguns longos minutos checando tudo o sistema operacional finalmente estará pronto para que você, o dono (será mesmo) faça uso de tudo quanto é coisa que você comprou, pagou, instalou e quer usar se e apenas quando o sistema operacional deixar você usar (modo ironia on …). Qualquer tentativa de fazer algo fora do controle do sistema operacional pode colocá-lo em risco e tudo será por sua conta e responsabilidade conforme diversos alertas que serão emitidos para pressioná-lo (quem avisa amigo é, já ouviram isso?) para não fazer nenhuma besteira. Algo do tipo não exclua este aplicativo porque poderá afetar outros aplicativos sensíveis e/ou vitais e o fornecedor não vai se responsabilizar.
Pois é, prepare-se porque em breve você terá na sua casa inteligente um sistema operacional controlando tudo e agindo como dono de tudo que você que comprou, pagou. O sistema operacional vai controlar tudo que estiver dentro dele agindo como o verdadeiro “dono” ou seja, esse sistema operacional vai “controlar” suas coisas. Bem-vindo ao futuro onde você será refém do sistema operacional que você, isso mesmo, você escolheu, comprou ou pagou, “levou” para casa e terá que conviver pelo resto dos seus dias.
Voltando ao começo, se por acaso você vive no campo ainda terá algumas opções ou alternativas, se tiver iniciativa. Nos centros urbanos a sua vida dependente de um sistema operacional poderá se complicar bastante se e quando este momento chegar em nossas vidas. Até lá espero que sejam criadas formas ou alternativas que não nos deixem tão dependentes de um sistema operacional tomando conta das nossas vidas.
Resgatei um texto lá do meio do ano passado que ficou largado pelo caminho. Nos próximos dias, semanas e meses voltaremos a tratar do que importa por aqui. Um assunto que devemos abordar são as sidechains e devemos voltar a falar dos blocos vazios, um tema que despertou alguma curiosidade.
Ótimo ano para todos.
1 - IBGE - Educa | População rural e urbana