Taleb Lucra de Novo Antecipando a Crise

Uma das personalidades que eu particularmente considero interessantes e tenho acompanhado ao longo dos últimos anos é Nicholas Nassim Taleb , autor de vários livros, dentre os quais o mais citado por aí é A Lógica do Cisne Negro , mas dizem que Antifrágil é melhor. Na dúvida leia os dois, ou todos os outros que ele já escreveu principalmente se você tem interesse em investimentos de renda variável. Se já não bastasse o polpudo lucro que ele colocou no bolso em plena crise do subprime lá em 2008, quando até grandes bancos americanos foram a falência, Taleb voltou novamente ao noticiário do mundo financeiro no início deste ano, em plena pandemia. De acordo com relatório assinado pelo principal executivo da Universa Investments of Miami, Mark Spitznagel o retorno do fundo sob sua gestão, com assssoria do Taleb, atingiu no primeiro trimestre de 2020 um retorno de 4.144%, deste total 3.612% foi apurado no mês de março, em plena pandemia do Covid19, quando as bolsas derreteram (ou tomaram e ainda estão tomando banho de sangue) principalmente lá nos Estados Unidos. A Universa Investments foi criada por Spitznagel e Taleb após os eventos globais da crise de 2008.

Talvez seja muita pretensão para alguém que sequer domina os fundamentos da língua portuguesa fazer tradução livre de qualquer texto escrito em outra língua. Quando os autores do texto original são personalidades renomadas esta iniciativa indica alguns sintomas de senilidade. Dizem que a gente vai perdendo o juízo quando vai envelhecendo, alguém viu o meu juízo caído por aí? Mas como já escrevi outras vezes, se papel aceita tudo, um aplicativo de redação de texto também aceita e corrige relativamente, quase tudo. Abaixo eu trago um texto escrito por três autores, sendo um deles Nassin Taleb , datado de 26 de janeiro de 2020 . Em tradução livre o título é mais ou menos o seguinte: “Risco sistêmico de pandemia por novos patógenos – Uma nota sobre o Coronavírus” . Além de Taleb assinam a nota Joseph Norman e Yaneer Bar-Yam (cientistas e pesquisadores do Instituto de Sistemas Complexos de Massachusetts, nos Estados Unidos).

Link do texto original em inglês: https://static1.squarespace.com/static/5b68a4e4a2772c2a206180a1/t/5e2efaa2ff2cf27efbe8fc91/1580137123173/Systemic_Risk_of_Pandemic_via_Novel_Path.pdf


“O novo Coronavírus que surgiu em Wuhan, na China foi identificado como sendo uma cepa mortal e altamente contagiosa. Até o momento (26/01/2020) foram implantadas (na China) restrições no deslocamento de dezenas de milhões de moradores em várias cidades da região num esforço para tentar diminuir a sua propagação. Apesar desse esforço já foram identificados casos em muitos países ao redor do mundo e existem dúvidas sobre a eficácia deste esforço de contenção. Esta nota descreve alguns princípios a serem seguidos em decorrência deste processo.

Estamos lidando claramente com um processo de cauda gorda devido á maior conectividade, ele se espalha de forma não linear. Processos com cauda gorda possuem características especiais, fazendo com que abordagens utilizadas na gestão de riscos convencional não sejam as mais adequadas.

Princípio Geral da Precaução

O princípio geral da precaução (não ingenuidade) delineia as condições e quais ações devem ser tomadas para reduzir o risco de falência, neste caso as análises tradicionais de custo-benefício não devem ser usadas. Ficar exposto de forma prolongada a este problema (pandemia) e aos eventos de cauda que se sucederão poderão resultar até numa eventual extinção (da humanidade). Enquanto existe uma probabilidade muito alta de sobrevivência da humanidade diante da ocorrência de um único evento, ao longo do tempo, existe chance zero de sobrevivência se ficarmos expostos repetidas vezes a esses eventos. Se por um lado indivíduos podem assumir riscos repetidas vezes isoladamente porque tem expectativa de vida limitada nunca deve ocorrer exposição a eventos repetidos no nível coletivo. Em termos técnicos o princípio da precaução aplica-se quando as médias estatísticas tradicionais não têm validade/utilidade porque os riscos não são ergódicos.

Empiricismo Ingênuo

A seguir abordaremos o problema do empirismo ingênuo nas discussões relacionadas a esse problema.

Taxa de espalhamento : as atuais estimativas de disseminação feitas com base em outras pandemias estão subestimando a taxa de disseminação por causa do rápido aumento da mobilidade proporcionada pela evolução dos meios de locomoção nos últimos anos. Isso significa que as expectativas quanto a extensão dos danos está sendo subestimada porque os eventos certamente terão cauda gorda e ficarão mais gordas à medida que a conectividade aumenta (os efeitos do evento se afastam da média tornando-se cada vez mais imprevisíveis).

A conectividade global está no nível mais alto de todos os tempos e a China é uma das sociedades mais conectadas globalmente. Fundamentalmente, eventos de contágio viral dependem da interação de agentes num espaço físico devido ao fator desconhecimento que os novos surtos (vírus novos ou mutações) necessariamente carregam. Reduzir a conectividade temporariamente para diminuir o fluxo de indivíduos potencialmente contagiosos é a única abordagem robusta contra estimativas erradas sobre as propriedades de um vírus ou de outros patógenos.

Taxa de reprodução : as estimativas de reprodução de um vírus (R0 – média de casos que são infectados a partir de um agente infectado sobre uma população não infectada) estão sendo estimados incorretamente (prevendo baixa necessidade de cuidados médicos intensivos). Esta análise não está levando em consideração a ideia de cauda gorda, baseando-se em vários eventos de alta disseminação individual do passado. Neste caso (esta pandemia), o índice R0 está sendo estimado a partir de uma média que vai demorar mais tempo para convergir, já que ela própria é uma variável da cauda gorda (o efeito causado extrapola a média e torna o resultado menos previsível).

Taxa de mortalidade: taxas de mortalidade e morbidade também são estimados incorretamente devido ao atraso entre os casos identificados, mortes e notificação dessas mortes.

Cada vez mais patógenos fatais surgem e se espalham rapidamente: Com o aumento da mobilidade estamos chegando perto de uma transição para a existência de condições em que a extinção se tornará certa, tanto porque a disseminação será rápida como também devido a predominância seletiva de patógenos cada vez mais agressivos.

Incerteza assimétrica: vírus com características desconhecidas tem impacto substancial sobre a eficácia das políticas de contenção que serão implementadas. Por exemplo: mesmo sendo contagioso existirão os portadores assintomáticos. Esse tipo de incerteza deixa dúvidas quanto a eficácia sobre medidas como verificação de temperatura em aeroportos. Na prática a incerteza tende a piorar potencialmente o problema ao invés de melhorá-lo, pois medidas como essas são convexos quanto à sua incerteza.

Fatalismo e inação : Talvez devido a esses desafios, uma resposta comum das autoridades de saúde pública seja o fatalismo/conformismo, aceitando o que acontecerá por acreditar que nada poderá ser feito. Esse tipo de comportamento é incorreto porque a escolha de alternativas selecionadas corretamente em conjunto com ações extras podem ser muito altas/positivas.

Conclusão : políticas tradicionais aplicadas em larga escala e individualmente, tais como: isolamento, rastreamento e monitoramento de contatos tornam-se rapidamente (computacionalmente) opressoras no meio de uma infecção em massa e, portanto, também não podem ser invocadas/usadas para barrar uma pandemia. Abordagens populacionais em escalas regional/local, incluindo redução drástica de redes de contato, diminuição de aglomerações, mudança de comportamento social e auto monitoramento da própria comunidade serão essenciais.

Em conjunto, essas observações levam á conclusão de que será necessário uma abordagem preventiva frente à esta pandemia e diante dos prováveis surtos que ocorrerão caberá avaliar ações de restrição aos atuais padrões de mobilidade nos estágios iniciais do surto, especialmente quando pouco se sabe sobre os verdadeiros parâmetros do patógeno.

No curto prazo a redução da mobilidade vai gerar um custo (econômico) mas se isso não der certo, vai custar muito mais caro, se não for neste evento poderá ser num evento futuro. Os surtos são inevitáveis, medidas preventivas e apropriadas podem mitigar o risco para o mundo em geral. Mas os responsáveis pela tomada de decisões no campo político devem agir com rapidez para evitar a necessidade gerada pela incerteza deparando-se com uma catástrofe de proporções irreversíveis equivalente a uma “paranoia” ou o inverso, acreditar que nada poderá ser feito.”


Observações: a maioria das palavras entre parênteses no texto acima são de minha autoria e abaixo tento explicar rapidamente o significado de três expressões e uma sigla que podem gerar alguma dúvida.

Cauda gorda (fat tail): tem várias explicações a respeito envolvendo vários campos de conhecimento. Aqui nos interessa a abordagem no campo dos investimentos, tendo em vista que um dos autores da nota é o Taleb . Basicamente existe o entendimento de que a probabilidade de ocorrência da maioria dos eventos e seus impactos ocorrem num ponto médio de uma curva em forma de sino. Taleb chamou de Cisne Negro a ocorrência de eventos extremos, imprevistos e inesperados que causam grande impacto atingindo pontos extremos e muito distantes do ponto médio de uma curva com distribuição normal (formato de sino).

Ergódico: é uma teoria do campo da matemática que estuda as propriedades estatísticas dos sistemas dinâmicos. Ela tenta entender como e com qual velocidade um sistema exposto a um evento atinge um novo estágio de equilíbrio e nesta situação qual é a sua configuração (igual ou diferente da anterior). É claro que o conceito é bem mais complexo, mas acho que já ajuda no entendimento do significado.

Empírico: visão empírica tem base na experiência e na observação metódica ou não dos acontecimentos. Leva em conta o resultado de medidas adotadas anteriormente relevando teorias e métodos científicos.

R0: é um número básico usada no campo da epidemiologia para identificar o nível ou grau de contágio de uma doença infecciosa. Atualmente estamos ouvindo falar bastante disso: uma pessoa com Coronavírus espalha o vírus para outras 3, 4 ou 5 pessoas.

Também é importante ressalvar e esclarecer que esta postagem é uma modesta tradução livre de uma nota escrita por três pessoas que não estão minimamente preocupados ou interessados com a nossa rotina tropical, abaixo da linha do equador. Além disso, sendo uma espécie de orientação/prevenção do que deveria ter sido feito previamente acaba ficando de certa maneira ineficaz expor uma eventual ideia de prevenção no auge da crise. Certamente você conhece alguém que chega com a solução quando o problema já foi resolvido ou quase isso? O ponto aqui é mostrar aos que investem em renda fixa qual é o calibre de gente que ganha dinheiro nesse mundo da renda variável, por acaso, quando muitos estão perdendo. Não quero desencorajar ninguém, acredito que existe espaço para todo mundo, eu mesmo invisto em ativos de renda variável, mas sempre é importante saber quem está na mesa quando colocamos a nossa carteira em cima dela. A minha conclusão é de que os autores perceberam no final do mês de janeiro deste ano que a melhor solução era implantar alguma restrição de mobilidade logo no início e no local onde o surto estava começando para evitar a disseminação do vírus. Esta seria uma medida que colocaria na mesa a questão econômica, indicando que uma ação inicial e localizada de contenção numa área delimitada via restrição da mobilidade não evitaria, mas causaria menos estrago na economia do que outras medidas que poderiam ser adotadas posteriormente, quando a epidemia já estiver espalhado por regiões mais extensas. Considerando que o Governo Americano (Trump) em janeiro achava que a crise não seria tão grave os gestores da Inversa Investments enxergando o potencial da crise tomaram suas precauções, como já tinham tomado pessoalmente lá em 2008 e mais uma vez ganharam muito dinheiro às custas dos apressados de sempre. Particularmente acho que ninguém sabe com certeza como vamos sair (num caixão, desempregado, divorciado, solteiro, rico, pobre, hipocondríaco, mascarado etc.) deste momento pelo qual estamos passando. Uns acham que tudo vai ser diferente, outros acham que vamos voltar a rotina anterior. A única coisa certa é que tudo é incerto neste momento. Outra certeza é que temos um encontro marcado com uma crise gigantesca, algo de uma proporção que nunca vimos antes. Também acho que a gritaria diária que ouvimos e vemos, seja na imprensa em geral ou pelas redes sociais aconteceu pelo fato desta pandemia ter começado entre a classe mais rica. Gente rica morrendo por causa de um vírus, mesmo tendo os melhores hospitais à disposição, não é bom sinal, pelo menos para eles. Na medida em que o vírus vai se alastrando e atingindo a periferia as pessoas acabarão ficando saturadas destas notícias. Aos poucos tudo isso acabará se tornando outra notícia igual a tantas outras notícias ruins. As estatísticas estão aí para mostrar que morre mais gente disso e daquilo e não se faz tanto alarde por causa disso. A força sensacionalista que hoje alimenta e atua inercialmente na disseminação de algo pior do que o vírus propriamente dito vai diminuir. Se nós não acabarmos morrendo no caminho vamos acabar nos cansando destas notícias. Coisas ruins tem grande impacto no início, mas na medida em que estas coisas ruins vão persistindo em nossas vidas elas acabam se tornando “menos ruins” porque o ser humano se adapta e convive com a nova situação. Logo depois que um avião cai e muitas pessoas morrem, evitamos entrar num avião até que o tempo passa e a vida segue, de preferência na classe executiva de um avião. O cidadão comum, ainda que isso não seja bom e somente depois de lutar como nunca, pode até se conformar. Talvez o uso de máscara se torne um hábito saudável, comemorações e festas sejam mais íntimas sem aqueles convidados tipo amigo do amigo. Ou talvez tudo seja esquecido e as pessoas continuem tossindo e espirrando nos trens e ônibus lotados de gente da periferia indo para o centro defender o pão, o leite a cerveja se sobrar porque ninguém é de ferro, se fosse não pegaria esse vírus e a festança de sempre volte a acontecer. Tanto faz se você está aproveitando o tempo para evoluir pessoalmente ou se está aproveitando para pôr o sono em dia. Tanto faz se você descobriu um novo parceiro diferente do que você “conhecia” na mesma pessoa com quem conviveu por tanto tempo ou se percebeu que seu(s) filho(s) são apenas pessoas com qualidades, defeitos, vontades e pirraças como qualquer um de nós, exceto pela energia que nunca acaba. Guarde lugar para a coragem na bagagem de volta para a nova velha rotina além de um pouco de espaço para não ver no outro apenas um monte de germes andando por aí, seremos apenas frágeis seres humanos, o vírus que o diga, tentando viver nossas vidas num mundo novo, incerto e para o qual não estávamos minimamente preparados, seja sob o aspecto econômico ou social. Quem sobreviver verá.

Vídeo sobre o texto, em inglês:

Para Taleb o Coronavírus é um Cisne Branco, era previsível.