Introdução
De origem Indiana Aswath Damodaran tem 67 anos, é Ph.D. (Philosophiae Doctor, geralmente traduzido como Doutor em Filosofia sendo que a palavra filosofia tem a ver com a busca e a investigação do conhecimento em qualquer disciplina). Um dos seus livros mais conhecidos é sobre valuation, processo usado para avaliar o valor um ativo que é muito usado no mercado financeiro. Seu livro mais recente é O Ciclo de Vida Corporativo, já disponível em português. O site Brazil Journal trouxe uma entrevista com Damodaran dividido em duas partes, publicadas nos dias 31/03/2025 e 01/04/2025. Entre outros assuntos Damodaran falou sobre IA – Inteligência Artificial que é um assunto sobre o qual temos olhado com alguma atenção nos tempos mais recentes, inclusive trazendo algumas postagens por aqui.
Vamos deixar um pequeno resumo por aqui e os links para acesso as duas partes que foram publicadas no site BrazilJournal mais abaixo, lembrando que a entrevista foi dada antes dos eventos mais recentes que foi batizado de tarifaço que ganhou impulso a partir deste mês de abril de 2025.
Parte 1
O trecho inicial que transcrevemos a seguir já é uma espécie de “choque de realidade” para quem entrou no hype tecnológico do momento, não tem nada a ver com Trump, estamos falando da inteligência artificial. Diz o professor Damodaran: “Vou fazer uma previsão: para a maioria das empresas, a inteligência artificial será um custo, não uma fonte de receita”.
Damodaran não está convencido e chama de sonho febril surgir um mercado de produtos e serviços de IA na casa dos 3,5 trilhões de dólares. Damodaran compara o surgimento da IA como surgimento dos PC’s. Quem ganhou dinheiro com isso foram as empresas fabricantes e para a grande maioria das empresas os computadores se tornaram custo e vai ocorrer o mesmo com a IA, alguns vão ganhar e o resto, a grande maioria, vai arcar com o custo de usar a IA. No momento o lucro está indo para os fabricantes de chips, para as empresas de data centers, empresas de energia e provedores de espaço de armazenagem de dados na nuvem. Num primeiro momento o uso da IA pode trazer algum benefício imediato como redução de custo pela substituição de um funcionário por uma IA.
Um pouco mais adiante Damodaran espeta outro ícone do mundo dos investimentos. Segundo Damodaran “Buffett tem sido um investidor mediano durante grande parte deste século. Suas grandes vitórias ocorreram no século passado”. Damodaran cita como exemplo o fato de Buffet não ter investido na Microsoft lá no começo, mesmo sendo amigo de Bill Gates. Para Damodaran o Buffet prefere empresas antigas e tem dificuldade para escolher empresas vencedoras no segmento de tecnologia, ele não se sente confortável neste terreno e por causa disso não faz grandes compras há mais de dez anos.
Damodaran diz na entrevista que as empresas precisam viver de acordo com o estágio de vida em que se encontram e faz críticas aos consultores que prometem rejuvenescer empresas, comparando esse tipo de trabalho com o que é feito pelos cirurgiões plásticos. Para Damodaran os resultados positivos nesse tipo de consultoria são raros. Exceções existem, como foi o caso da Apple em 2000. Quem não quer ser jovem, até mesmo as empresas buscam isso e acabam cometendo um grande erro nas palavras de Damodaran.
Entrando no lado político e bastante atual, Damodaran faz uma comparação entre o que o Presidente da Argentina, Javier Milei fez por lá (quebrou as coisas e depois está vendo o que dá para consertar) e diz que Elon Musk está tentando fazer com o governo dos EUA algo parecido. Apesar de concordar que o governo dos EUA estava precisando passar por um processo de disrupção Damodaran não sabe se o melhor caminho é esse que está sendo trilhado pelo governo Trump. É certo que sistemas tradicionais dificilmente se ajustam internamente, por suas próprias mãos. A dúvida que fica é se o que dá certo a nível empresarial pode dar certo no nível governamental. As repercussões negativas podem ser bem grandes, por exemplo, no terreno da saúde para os mais necessitados. Todo governo que começa diz que vai consertar as coisas e no fim acabam aparando arestas, ajeitando aqui e ali e seguem em frente porque todos os governos ao longo do tempo contribuíram na construção de práticas ruins ao longo de décadas e chega uma hora em que já não é possível consertar por meio de pequenos remendos. Talvez o processo de quebrar e consertar o que dá acabe mostrando que não é possível consertar logo em seguida e isso pode gerar consequências, especialmente para a parte mais vulnerável da população.
Parte 2
Para Damodaran o Presidente Trump foi eleito com o voto dos operários do Meio Oeste americano prometendo trazer de volta os empregos e as indústrias, sob esta ótica as tarifas fazem parte desse processo. Ele diz que a escolha é por uma desaceleração econômica em prol do aumento da produção dentro dos EUA. Os consumidores americanos vão pagar o preço dessa escolha, os produtos ficarão mais caros. O objetivo do atual governo americano é que a Ford ou a Stellantis construam as suas próximas fábricas nos EUA e não no México ou no Canadá.
Um diagnóstico que aparece com frequência também é citado por Damodaran. A globalização teve seu lado bom, mais opções de produtos e preços mais baixos. O lado ruim e muitos ignoram esse lado que trouxe um sentimento de frustração em todas as partes do mundo tirou os empregos na indústria em alguns países e transferiu esses empregos para outras partes do mundo. Diante desse cenário que mexe com a esperança das pessoas o discurso de minimização das perdas soa vazio e a resposta veio, por exemplo, com as vitórias de Trump e com o Brexit.
Na questão das tarifas a visão da Damodaran é bem clara. As tarifas sempre existiram. A China chegou onde está em boa medida por causa das tarifas. O Brasil impõe uma séria de tarifas pesadas para proteger a sua indústria. Os produtores de arroz no Japão são protegidos com tarifas. O que Trump fez foi tirar o esparadrapo e mostrar a ferida que estava escondida.
Especificamente sobre o Brasil Damodaran disse que damos três passos para frente e dois para trás. Temos deficiências na infraestrutura que requer muito dinheiro e acaba atraindo corrupção, o processo de avanço é lento. Para quem olha de fora é difícil encontrar no Brasil grandes empresas criadas nos últimos 20 anos, o Nubank pode ter sido uma exceção. Não dá para crescer apenas com empresas velhas, que estão no topo sob comando de pessoas idosas, sem energia e novas ideias. Enquanto o retrato empresarial do Brasil mostrar Petrobrás e Vale será um retrato do século XX e não do século XXI. É preciso deixar de proteger as “jóias da coroa” e encontrar uma maneira de criar um ambiente favorável para o surgimento e crescimento de empresas jovens que possam crescer e atingir o topo do segmento onde atuam.
Link para a página pessoal de Damodaran, em inglês: