Como incluir um texto no Blockchain do bitcoin sem entender programação

Talvez você tenha lido algo a respeito de uma mensagem incluída no primeiro Blockchain (do bitcoin), que é a transcrição de uma manchete da edição do dia 03/01/2009 do jornal londrino The Times que dizia o seguinte: “Chancellor on brink of second bailout for banks”.


Imagem retirada de: https://twitter.com/bitcoin/status/1164145123434758147


Imagem retirada de: Fabrício Alexandre: o halving de 2020 e uma mensagem (quase) secreta para a posteridade – Money Times

Chancellor geralmente é uma abreviação de Chancellor of the Exchequer (A) que podemos traduzir livremente como Ministro do Tesouro. No Brasil o cargo equivalente seria o de Ministro da Economia ou da Fazenda. Interpretando a frase a manchete diz algo como: “Ministro da Economia do Reino Unido está prestes a socorrer bancos pela segunda vez”. Para os que eventualmente não sabem o ano de 2008 foi um ano de crise econômica (B) que atingiu com força a liquidez dos bancos, causando a falência de alguns. Essa fragilidade do sistema financeiro e do dinheiro impresso é considerado um dos motivos que deram origem ao lançamento do bitcoin.

Os registros (contábeis) das transações/transferências (débitos e créditos) entre contas ficam gravadas/arquivadas no Blockchain. Estas transações, por sua vez, são agrupadas/juntadas em forma de bloco com milhares de transações que são processadas durante cerca de 10 minutos. Muitos explicam o Blockchain como um grande livro contábil (razão) onde são registradas essas movimentações. Outro fator que está ligado ao Blockchain é sua perenidade e “inviolabilidade” que podemos “traduzir” como confiável e seguro. Ou seja, uma vez registrado no Blockchain do bitcoin, uma transação torna-se imutável e até mesmo a reversão/estorno da transação/lançamento não é possível, a não ser que seja feita uma nova transação com a colaboração da outra parte com os devidos pagamentos das respectivas taxas. Entre outros fatores a perenidade persistirá enquanto houver internet funcionando. Ressaltando que estamos falando de um Blockchain público (do bitcoin). Existem Blockchains privados, que tem dono controlando o acesso dos terceiros, o funcionamento, o que é processado lá etc.

Operando numa espécie de “segunda camada” (rede P2P) da rede onde não há um servidor ou servidores exclusivos e passíveis de serem “desligados” pela vontade de um “dono” ou de “autoridades” o sistema poderá funcionar enquanto existir a internet. De forma bem simples e resumida a rede P2P funciona usando os computadores dos usuários como “servidores” bastando que um destes PC’s esteja ligado na internet para dar vida ao sistema. Isso é possível porque ao instalar os programas de um Blockchain no seu PC você abre uma “porta” para se comunicar com outros PC’s espalhados em qualquer lugar do mundo e talvez algum dia do universo. Desta forma o seu PC “conversa” com outros PC’s mantendo o sistema em funcionamento numa espécie de “segunda camada” sem depender de um servidor central sob comando de alguma “autoridade” ou “dono” que pode desligá-lo a qualquer momento.


Imagem retirada de: O que é P2P e como ela funciona?

Qualquer usuário sem depender de autorização, indicação, escolha, localização, idade ou poder financeiro pode olhar o que os outros PC’s conectados ao sistema estão fazendo [exemplos: processando as transações de débito/crédito que estão sendo realizadas (mineração) ou mantendo arquivo com as transações já realizadas e confirmadas para que qualquer pessoa possa consultá-las a qualquer momento]. Por causa destes e de outros fatores, neste universo não existe “sigilo bancário”, todas as transações realizadas dentro do Blockchain do bitcoin podem ser consultadas, desde a primeira até a última que foi confirmada dentro do sistema. Além disso qualquer um, mesmo que não esteja conectado ao sistema poderá consultar qualquer transação (data, valor, conta creditada e debitada etc.). A “segurança” do sistema é real considerando que desde o dia em que entrou em operação ele funciona 24 horas por dia sem parar e sem ter sofrido algum tipo de violação dentro do sistema.
A principal função de um Blockchain é manter os registros “contábeis” das transações de forma permanente e confiável. Mas tendo sido incluído uma mensagem logo no primeiro bloco de transações do sistema outros usuários perceberam que outras mensagens poderiam ser incluídas respeitando a limitação de tamanho para evitar que o Blockchain se transforme num imenso repositório de registros que tornaria impossível seu funcionamento numa rede P2P rodando em PC’s “caseiros”.
Com o passar do tempo milhares de mensagens foram incluídas nos blocos (que agrupam certa quantidade de transações enviadas para o sistema). Algumas se tornaram mais conhecidas por causa da sua divulgação e outras permanecem desconhecidas, mas ficarão por lá (no Blockchain) enquanto existir internet. Surgiram até negócios criados em cima desta funcionalidade, como é o caso pioneiro da empresa OriginalMy (C). Entre outros motivos, sendo uma delas o custo as empresas deste segmento oferecem alternativas fora do Blockchain do bitcoin.
No caso específico das mensagens sem caráter comercial ou jurídico (como meio de prova) encontramos obituário (registro de morte), frases bíblicas (…no princípio Deus criou a Terra…), declarações de amor (alguém ama alguém), casamento ou nascimento e talvez até mensagens cifradas que somente os remetentes e destinatários possam entender.
O que era no início algo acessível somente aos que conheciam programação e especificamente as linguagens usadas na criação e desenvolvimento das criptomoedas em geral passou a ser um negócio como outro qualquer. Mediante pagamento qualquer um pode incluir qualquer mensagem no Blockchain do bitcoin para a eternidade.


Imagem retirada de: Bitcoin Explorer - Blockstream.info

Sendo um sistema é preciso usar uma espécie de “tradutor” aproveitando um script conhecido como op-return. As mensagens precisam ser escritas no formato hexadecimal para que o sistema aceite o registro. Por sua vez para ler a mensagem também é preciso transformá-la no formato texto. Mas tudo isso é possível e acessível para qualquer um, mesmo para quem não entende nada de programação, basta saber onde procurar.

Um desses “locais’ onde você pode “comprar” a inclusão de uma notícia ou informação é o site “proof of existence” (D) pagando 0,00025 BTC que equivale a cerca de 85 reais na cotação do dia 01/04/2021. Salve engano o tamanho é limitado a 80 caracteres ou 40 bytes.


Imagem retirada de: https://proofofexistence.com/

Outra opção é o site bitscribble (E) onde também é possível ver algumas mensagens que já foram incluídas para a eternidade no Blockchain do bitcoin. Não consegui ver o custo, acho que precisa inserir a mensagem e ver quanto custa. Se você pagar a mensagem é incluída caso contrário nada acontece.
Para encerrar, quanto a questão da “tradução” entre a linguagem hexadecimal e texto existem vários disponíveis, um deles é o onlin-toolz (F). Você pode converter um texto para a linguagem hexadecimal e fazer o contrário, sistemicamente falando parece que é algo bem simples.


Imagens retiradas de: Text to Hex Converter - Online Toolz

A – Chancellor of the Exchequer - Wikipedia

B - Crise financeira de 2007–2008 – Wikipédia, a enciclopédia livre

C - https://originalmy.com/

D - https://proofofexistence.com/

E - https://bitscribble.com/

F - Text to Hex Converter - Online Toolz

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Excelente! Sempre muito bem escrito e bem fundamentado. Confesso que ,eu mesmo não que poderiamos escrever nos registros da blockchain. Esse universo da blockchain, é muito surpreendente, e, evolutivo pra melhor! Viva, a tecnologia dos blocos!

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