A Moeda Digital Chinesa está pronta

Olá,

A Libra pode estar fazendo um grande barulho aqui pelo lado ocidental deste planeta tão maltratado pelos liberais, bom pelo menos é o que dizem, até o Papa já entrou nessa pedindo orações e/ou preces e ao que parece pediu até intervenção de líderes em defesa do…mato…das plantinhas…da grama…ou melhor da floresta amazônica. Com todo o respeito que tenho por sua Santidade, acho que existem coisas mais legais para ele defender, como por exemplo pedir aos líderes dos países europeus que recebam os coitados que tentam atravessar o mar vindos da África. Mas lá do outro lado, no oriente, existe um país chamado República Popular da China, popularmente chamado apenas de China, um país que sozinho concentra cerca de 1/5 da população mundial, em números recentes são cerca de 1 bilhão e 405 milhões de chineses. Comparando por exemplo com a população atual dos Estados Unidos, se cada chinês pegar um americano no mano a mano, ainda sobrariam mais de 1 bilhão de chineses já que a população atual de americanos é de cerca de 330 milhões (parece até coisa de “white walkers” ou seriam “china walkers” contra os americanos). Só para constar e não perder a viagem vale registrar que a população atual do Brasil é de cerca de 215 milhões de indivíduos (trouxas, otários ou patos segundo o atual Ministro da Economia Paulo Guedes). Juntando a população dos 27 países que formam a União Européia a conta passa um pouco dos 500 milhões, ou seja, para chegar na metade teria que juntar o Brasil (será que os Europeus iam querer? Tenho minhas dúvidas). Mas o papo aqui neste fórum não é sobre a população desses países e sim sobre o mundo cripto em geral. Vamos ao ponto, no dia 10 de agosto deste ano Mu Changchun, vice diretor do Banco do Povo da China (People’s Bank of China) também conhecido como Banco Popular da China e para nós Banco Central da China anunciou que a moeda digital chinesa baseada em plataforma Blockchain está pronta após 5 anos de desenvolvimento. Numa conta rápida dá para concluir que os chineses estão desenvolvendo a moeda digital deles desde 2015. Nesse período os chineses meio que “baniram” ou tentaram banir as criptomoedas proibindo ICO - Initial Coin Offering, travaram as Exchanges, dificultaram a vida dos mineradores, etc. Isso me lembra o Facebook proibindo criptos e depois lançando a sua própria cripto.

O desenho estrutural do sistema de moeda digital Chinês tem dois níveis, no primeiro atua o BC Chinês controlando essa moeda digital (emissão e circulação). Afinal a China ainda é politicamente centralizada, partido único e tal, mesmo que a economia chinesa insista em nos enganar. No segundo nível estariam os bancos comerciais atuando junto ao público em geral.

Quais são os pilares dessa moeda digital estatal que o governo chinês desenvolveu além do fato de ser centralizado, estatal e não adotar um Blockchain puro?

O primeiro motivo remete a introdução que fizemos com relação a população. Se o BC Chinês resolvesse atuar diretamente junto a população emitindo e controlando a tal moeda digital chinesa teria que manter uma estrutura gigantesca para manter contas correntes na casa das centenas de milhões realizando transações o tempo todo. Pensando em termos de Brasil só de pensar no nosso Banco Central cuidando diretamente das contas de todos os clientes dos cinco maiores bancos daqui (Banco do Brasil, CEF, Itau, Bradesco e Santander) já seria impensável e/ou impraticável. Desta forma a adoção do segundo nível distribuindo o atendimento para a população entre os bancos comerciais foi uma solução operacional e de minimização de riscos, entre outras questões.

O segundo motivo seria descentralizar o desenvolvimento da tecnologia e por consequência, propiciar inovação, expandir e difundir o estudo dos conhecimentos relacionados a este sistema por meio da “concorrência” entre os bancos comerciais. Nada como uma boa competição entre os fornecedores para que no fim os clientes sejam beneficiados. Bom, pelo menos na teoria é assim que deve ser.

O terceiro motivo esta relacionado aos riscos existentes numa atuação centralizada do BC Chinês como banco único. Numa eventual adoção do sistema de um nível, com o BC Chinês passando a atuar como banco comercial atendendo diretamente a enorme população chinesa o risco de um eventual problema bancário seria monumental. Qualquer falha no sistema teria potencial para se tornar gigante num país com as dimensões e com a escala populacional que eles tem pendurado numa única instituição. Dá para imaginar um país com as dimensões e com a população como a chinesa ficando um dia sem ter a sua moeda digital fluindo (comércio, serviços, empréstimos, etc.) por lá?

O quarto motivo é que a adoção do sistema de dois níveis impede a ocorrência da desintermediação financeira. Esse fenômeno ocorre quando as atividades bancárias tradicionais como as que estão atreladas as contas bancárias (depósitos, empréstimos, etc.) deixam de ser realizadas por bancos impedindo ou dificultando o acesso ao sistema. Uma outra questão diretamente ligada a essa concentração estaria no reflexo que causaria no custo do dinheiro. Para emprestar dinheiro os bancos precisam ter o dinheiro (ninguém empresta algo que não tem, alguém aí quer vento emprestado?) e as duas formas básicas de entrada de dinheiro nos bancos são os depósitos à vista que os clientes mantém em suas contas e os depósitos á prazo que são os depósitos remunerados que também são chamados de captação pelo lado dos bancos. Aproveitando o momento, a diferença entre o que o banco paga para você deixar seu dinheiro investido lá e o quanto ele cobra para emprestar esse dinheiro na outra ponta se chama “spread”. Nesse tal “spread’ entra toda a cadeia de custos do banco (salários, impostos, manutenção, sistemas, prestadores de serviços, aluguéis, luz, provisão/perdas com os picaretas, etc.). É claro que a conta é mais sofisticada mas grosso modo é mais ou menos assim que o banqueiro descobre quanto paga para você e quanto vai cobrar de quem pede emprestado e não ficar no “preju” no final das contas. Outra continha que os banqueiros fazem e cobram dos seus executivos é cobrir todas as despesas com funcionários com as tarifas. Ou seja, supondo que o custo mensal da folha de pagamento de um banco é de 200 milhões a rede deve contabilizar no final do mês tarifas em montante igual ao maior do que o custo da folha. Se o dinheiro digital ficar concentrado no BC Chinês os demais bancos comerciais terão dificuldade para ter dinheiro para emprestar porque não terão acesso aos depósitos dos clientes e por consequência passarão a cobrar mais caro para emprestar o dinheiro. Com a adoção da segunda camada tudo continuaria, em tese, como é hoje.

Sem citar dados mais precisos o executivo do BC Chinês disse que a introdução da moeda digital tem como público alvo transações de varejo de baixo valor no comércio popular, não deve interferir na politica monetária, não deve interferir de forma negativa na economia e não teria efeito pró-ciclico. Pró no sentido de a favor ou contribuindo para aumentar algum efeito, geralmente de natureza econômica. Não sou economista mas já lí por aí que uma medida pró-cliclica seria aumentar os gastos públicos para gerar crescimento econômico e uma medida anti-ciclica seria cortar e/ou diminuir gastos públicos diante da queda da arrecadação. Num certo país chamado Brasil o problema é que os tais gastos são carimbados constitucionalmente e não podem ser cortados nem reduzidos mesmo que a economia esteja mal das pernas (queda na arrecadação dos impostos) e aí resta a velha saída, pegar emprestado emitindo títulos. Neste sentido o BC Chinês poderá adotar algumas medidas para controlar eventuais efeitos indevidos que essa moeda digital possa vir a causar na economia impondo medidas como limite máximo de gastos e estocagem (ou melhor poupança) da moeda digital. O executivo do BC Chinês ainda garante que lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo serão combatidos dentro de regras de compliance.

Bom é isso, em linhas gerais, enquanto os Americanos e Europeus estudam uma forma de eventualmente “barrar” a Libra antes que ele venha a nascer os Chineses já tem a sua moeda digital pronta depois de cinco anos de estudos.

Notícia:

Estudo do BC brasileiro sobre digitalização da moeda